O setor supermercadista no Brasil enfrenta um dos maiores desafios de gestão de pessoas: a alta rotatividade. De acordo com o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), a taxa de turnover no varejo alimentar pode ultrapassar 50% ao ano, sendo uma das mais altas entre os segmentos do varejo.
Essa realidade impõe custos elevados para as empresas, impacta diretamente a experiência do cliente e compromete a eficiência operacional. Mas como o RH e as lideranças de operações podem enfrentar esse cenário de forma estruturada e estratégica? Reuni aqui algumas iniciativas que podem ajudar a reduzir a rotatividade no seu negócio, qualificar a mão de obra e fortalecer a cultura organizacional sem comprometer a eficiência do negócio.
O impacto da alta rotatividade no setor supermercadista
As altas taxas de rotatividade impactam significativamente aspectos financeiros e operacionais das empresas. Em um cenário de turnover elevado, o custo de reposição por colaborador pode variar entre 4 e 8 vezes o salário mensal (considerando médias de gastos com recrutamento, seleção, treinamento e perda de produtividade), o que representa de 30% a 50% do seu salário anual. Para redes que empregam milhares de colaboradores, essa conta se torna expressiva e compromete a rentabilidade do negócio.
Além do impacto financeiro, a frequente troca de profissionais afeta a experiência do cliente. Colaboradores pouco treinados e sem conexão com a cultura da empresa tendem a prestar um atendimento menos qualificado, resultando em menor fidelização e queda nas vendas. Em um ambiente de alta demanda e ritmo acelerado, a falta de padronização nos processos também prejudica a eficiência operacional, comprometendo desde a reposição de produtos até o atendimento no checkout.
Por que a rotatividade é tão alta no setor?
O trabalho em supermercados pode ser desafiador por diversas razões. Entre os principais fatores que levam à alta rotatividade estão:
- Baixos salários e benefícios pouco atrativos;
- Ambiente de trabalho dinâmico, com jornadas longas e exaustivas;
- Falta de perspectivas de crescimento profissional;
- Cultura organizacional pouco estruturada para retenção e engajamento;
- Pouco investimento no desenvolvimento e qualificação dos colaboradores.
Estratégias para aumentar a atratividade e retenção de talentos
Para reduzir a rotatividade, empresas supermercadistas precisam adotar iniciativas que tornem seus ambientes de trabalho mais atrativos e promovam o crescimento dos colaboradores. A seguir, listei quatro ações que podem trazer alto impacto na redução da rotatividade em empresas do setor:
Programas estruturados de onboarding e desenvolvimento contínuo
A primeira semana de um novo colaborador é decisiva para sua permanência na empresa. Um onboarding bem estruturado, que faça com que o novo colaborador se sinta realmente acolhido e integrado à rotina, indo além da apresentação da cultura da empresa e incluindo vivência prática e treinamentos iniciais, pode aumentar a retenção e transformar completamente esse primeiro contato, gerando um impacto positivo duradouro. O processo torna-se mais produtivo e melhor aproveitado por todos os envolvidos.
Oferecer capacitação contínua e trilhas de desenvolvimento profissional para alguns cargos com rotinas mais sensíveis também pode ser um divisor de águas no processo de retenção do colaborador ao longo de sua jornada de desenvolvimento na companhia. Operadores de caixa que precisam manter boa conexão com o cliente sem abrir mão da agilidade, evitando a formação de longas filas. Profissionais de açougue e outras áreas que demandam competência técnica mais específica precisam saber como conduzir com qualidade sua rotina de trabalho. E, em especial, líderes de seção, supervisores e gerentes das loja, que possuem cargos de liderança e ainda mais responsabilidade, precisam ampliar sua visão estratégica sobre o negócio, aumentando os níveis de engajamento e produtividade.
Cultura organizacional focada no pertencimento
A retenção de talentos passa diretamente pela cultura da empresa. Supermercados que valorizam seus colaboradores por meio do reconhecimento, da comunicação transparente e da criação de um ambiente de trabalho humanizado conseguem aumentar o engajamento e comprometimento, reduzindo o turnover. Pequenos gestos, como feedbacks frequentes e planos de carreira bem definidos, fazem grande diferença.
Benefícios atrativos sem onerar a folha
Oferecer benefícios diferenciados ajuda na redução da rotatividade sem aumentar consideravelmente os custos operacionais. Programas associados a participação nos resultados, descontos em produtos da própria rede, parcerias com farmácias, academias, restaurantes e outros estabelecimentos comerciais, vale-alimentação compatível com o mercado e apoio psicológico são alternativas viáveis para reter talentos.
Liderança presente e desenvolvida
Os gerentes de loja têm um papel fundamental na retenção de talentos. Líderes preparados sabem motivar equipes, oferecer suporte e criar um ambiente de trabalho mais leve e produtivo. Programas de desenvolvimento para lideranças operacionais, capacitando-as para uma gestão humanizada e com foco em resultados, reforçam os pontos abordados no primeiro tópico, gerando um círculo virtuoso de iniciativas que se interconectam.
A alta rotatividade no setor supermercadista é um desafio semelhante ao de vários outros setores do mercado de varejo e consumo, mas pode ser mitigada com estratégias bem estruturadas. Investir em onboarding, cultura organizacional, benefícios atrativos e lideranças preparadas são algumas medidas para aumentar a retenção e a produtividade. Ao criar um ambiente de trabalho mais engajador e oferecer caminhos de crescimento para os colaboradores, as redes supermercadistas não apenas reduzem custos operacionais, mas também melhoram a experiência do cliente e impulsionam seus resultados.
A solução para a rotatividade está na valorização das pessoas. Afinal, supermercados são feitos por pessoas e para pessoas.
Roberta Andrade é diretora de Educação Corporativa e sócia da One Friedman e da Gonow1.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo
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